sexta-feira, 3 de janeiro de 2014

Crônica: MEU MONOQUÍNI ROXO, de Lucia MILLET

MEU MONOQUÍNI ROXO




Eu sempre fui vidrado na moda aeróbica dos anos 80, collants bem cavados ou calcinhas fio-dental, usados por cima das bermudas de Lycra, deixavam o bumbum das mulheres maravilhosos. Havia um collant que eu achava lindo, com uma abertura redonda na frente, deixando o abdome à mostra. Tinha ainda monoquíni, um collant com as alças bem longas, para ser usado com um top por baixo. Nas academias as mulheres faziam as combinações mais loucas de cores com as peças sobrepostas.
 Quando o caso aconteceu, lá por 1993, algumas dessas roupas já tinham saído de moda, inclusive o monoquíni. Mas passando por uma rua do Brás, aqui em São Paulo, região que concentra o comércio de roupas, inclusive por atacado, vi uma lojinha com vários monoquínis expostos.  Fiquei louco de vontade de comprar um para mim, só que na época (e ainda hoje um pouco) eu tinha muita vergonha de entrar numa loja e comprar roupas de mulher. Mas como aquela região era frequentada também por gente que comprava para revender, eu fingia que era revendedor. De uma outra vez, já havia comprado duas dúzias de calcinhas fio-dental sortidas. Na verdade eu não precisava de tantas, mas fazia parte do meu disfarce. Porém, mesmo dizendo que estava comprando para revender, eu ficava tão nervoso na hora, que as vendedoras logo desconfiavam de mim.  
 Dei uma volta pelo quarteirão para passar de novo pela lojinha que vendia os monoquínis, aproveitando para dar uma olhada para dentro, e notei que só tinha uma vendedora. Depois disso fui e voltei inúmeras vezes pela rua, diminuindo o passo diante da lojinha para admirar os monoquínis, sem coragem de parar, muito menos de entrar. Fui até um bar, tomei uma pinga com limão e uma cerveja, para criar ânimo. Depois, já um pouco alto, tive que dar mais três voltas pelo quarteirão, porque a vendedora estava atendendo outras freguesas. Enfim, numa das passadas, vi que a vendedora estava sozinha e entrei na lojinha. A vendedora logo veio com aquele: “Pois não?” Embaraçado disse para ela que eu e minha mulher vendíamos roupas de ginástica, e queria ver os monoquínis. Fiz perguntas sobre os tamanhos, o preço de varejo e de atacado, enquanto ela estendia os monoquínis sobre o balcão. Ela me mostrou os tops, as bermudas e os macaquinhos que faziam conjunto com os monoquínis. Não sei se por causa do nervosismo que eu aparentava, percebi que ela não estava muito à vontade com minha presença ali. Num canto, vi uma Bíblia aberta sobre o balcão e pensei: só falta ela querer me converter. Eu só queria fazer a compra logo e ir embora daquele lugar. Disse que ia comprar apenas algumas peças, para mostrar para minha mulher, e se ela gostasse voltaria para comprar mais. Escolhi um monoquíni roxo e outro vermelho, um top, uma bermuda e um macaquinho, esses todos rosas, porque era a única cor que ela tinha. Paguei, peguei o troco e agradeci. A vendedora ainda disse um “Vai com Deus!”, enquanto eu saía da lojinha.
Enfim, quando cheguei em casa, pude experimentar as peças e ficar me admirando no espelho. Os monoquínis ficavam maravilhosos em mim, principalmente o roxo, com o top rosa por baixo. A bermuda e o macaquinho eram esquisitos, e algum tempo depois acabei jogando os dois fora. O monoquíni vermelho eu usei por vários anos, mas enjoei dele e também joguei fora. O monoquíni roxo e o top rosa eu tenho até hoje, faz mais de vinte anos.


Lucia Millet, 02/01/2013.  

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